Se lhe parecer que um desenho a lápis ganhou vida a três dimensões, isso é... uma obra de David Oliveira. Estas esculturas em arame podem ser visitadas até 18 de dezembro. Veja algumas na fotogaleria.
Ao contrário de outros, menos afortunados, que continuam a ser artistas no arame, David Oliveira tornou-se um artista do arame. E se é certo que todo o artista pretende deixar uma marca, no caso dele não há dúvida de que o objetivo foi atingido: as suas obras têm um traço bem reconhecível. E aqui traço não é uma metáfora para dizer estilo: é que os seus trabalhos parecem mesmo desenhos a lápis feitos no ar. Porém, são esculturas. Ou instalações. O nome é o que menos importa.
David Oliveira tem 35 anos e há sete que se dedica a criar estes curiosos objetos. “O que me atraiu no arame foi a capacidade de gerar uma linha, livre, que se pudesse movimentar no espaço tridimensional”, explicou ao Observador.
Assume-se como um artista visual. Licenciou-se em Escultura (na Faculdade de Belas-Artes, em Lisboa), especializou-se em Cerâmica e fez o mestrado em Desenho e Anatomia Comparada (Animais). Depois deu aulas, trabalhou no teatro (como técnico, aderecista e cenógrafo) e há três anos que vive apenas da sua arte. O sonho de uma vida para muitos, alcançado por ele aos 32 anos.
Intitulada ‘Movimento Total’, a exposição que agora está patente no Palácio Pombal (à Rua de O Século, 79, em Lisboa) evoca o movimento do Homem no espaço mas também no tempo: a sua evolução enquanto espécie. Ele é o último elo da cadeia. No entanto, não há aqui figuras humanas representadas, o que foi intencional. “É uma forma de pensar o Homem através dos animais que partilham a sua história no planeta. Eles são as testemunhas da nossa passagem”, afirma David.
E assim, espalhada por duas salas da exposição, surge uma autêntica família numerosa de animais saídos das suas mãos. David explica: “Através do uso de arame e de poliamida (tule) evoco 18 espécies. Construo-as de dentro para fora, partindo da premissa evolutiva que todo o organismo natural deriva de um anterior, e de que o movimento é o motor da biodiversidade.”
Entregue aos bichos
A exposição divide-se entre o habitat aéreo e o aquático. Na escadaria da entrada encontramos os pássaros: a coruja, o papagaio, o tucano, o cisne, o pato, a cegonha, o abutre e uma garça. Suspensos no ar e representados em pleno voo. Na sala do fundo, as criaturas marinhas: o peixe vela, o atum, as medusas, as douradas, o carapau, a raia, o polvo e até uma foca grávida. Todos eles à escala, em tamanho real.
Dar asas à criatividade: esculturas de aves, num movimento suspenso, feitas de arame
Este projeto surgiu após nove meses de gestação, durante os quais David Oliveira teve um ateliê em permanência no edifício onde agora expõe o resultado do seu trabalho. Algumas peças terminou-as num só dia, outras numa semana e houve até as que demoraram um mês. “Cada peça apresenta o seu desafio”, explica. “Pode ter a ver com a estrutura, a composição ou a lógica…” Mas o verdadeiro desafio, confessa, está em conseguir passar a mensagem.
Por exemplo, quando comecei a fazer os pássaros, a minha irmã perguntou-me se aquilo eram dinossauros. Fiquei delirante.”
Através destas figuras, David Oliveira propõe uma forma de a arte se relacionar com questões atuais, como as alterações climáticas e a perda de biodiversidade. Defende “uma arte de propaganda, cujos ideais falem de ética, respeito e educação”.
A inspiração vai buscá-la a “todos os homens e mulheres que acreditam em ideais e lutam por eles”. “Estou a falar dos que conhecemos: Leonardo Da Vinci, Martin Luther King, Rosa Parks, Gandhi, Steve Jobs, Malala Yousafzai, Nelson Mandela; e dos que desconhecemos mas que fazem do mundo um lugar melhor”, afirma.
David Oliveira vai traçando os seus desejos para o futuro. Quer expor os seus animais aquáticos no Oceanário e os pássaros no Museu de História Natural. E, acima de tudo, gostaria de ver os seus trabalhos “em sítios públicos, acessíveis a todos, pobres e ricos, crianças e velhos”. E conclui: “Acredito que a arte deve fazer parte da vida.”
In: Observador por Catarina Sacramento, fotografia de Hugo Amaral